Estudo da Escola Nacional de Seguros aponta perdas da capacidade produtiva com os acidentes graves, que equivalem a 5,42% do PIB, o quarto maior do Brasil
Uma tragédia cotidiana com efeitos de longo prazo na sociedade, nas famílias e na capacidade produtiva do Ceará. A violência no trânsito provocou um impacto econômico de R$ 7,5 bilhões no ano passado, ou 5,42% do Produto Interno Bruto (PIB). Essa foi a perda da capacidade produtiva causada por acidentes que mataram 2.325 pessoas e deixaram outras 4.499 com invalidez permanente no estado. O valor corresponde ao que seria gerado pelo trabalho das vítimas caso não tivessem se acidentado. É o quarto maior do Brasil. Os cálculos são do Centro de Pesquisa e Economia do Seguro (CPES), órgão da Escola Nacional de Seguros.
O estudo, com base nos indicadores do Seguro DPVAT (seguro obrigatório de automóveis), aponta um aumento expressivo do número de vítimas fatais e com alguma sequela permanente no estado: de 5.846 em 2016, para 6.824 no ano passado. Assim, o impacto total das perdas produtivas foi 16,7% maior no período. O fator que mede a perda da capacidade produtiva é chamado de Valor Estatístico da Vida (VEV), ou seja, o quanto cada brasileiro é capaz de produzir em sua vida.
Os dados ganham relevância ainda maior durante o Maio Amarelo, movimento que busca conscientizar a sociedade para o alto índice de mortos e feridos no trânsito em todo o mundo. No Brasil, a violência do trânsito brasileiro provocou um impacto econômico de R$ 199 bilhões no ano passado, ou 3,04% do Produto Interno Bruto (PIB). Essa foi a perda da capacidade produtiva causada por acidentes que mataram 41,1 mil pessoas e deixaram outras 42 mil com invalidez permanente. O impacto total das perdas produtivas foi 35,5% maior no período.
“O que mais chamou atenção é que o Brasil vinha de um período de queda dos indicadores de violência no trânsito. Mas, nesse último ano, os números dispararam, voltando ao cenário de 2015. E com características muito preocupantes: 90,5% das vítimas estavam na fase economicamente ativa e mais de 74% dos acidentes envolveram motocicletas, fazendo com que 59% dos acidentados fossem os próprios condutores”, alerta Mario Pinto, diretor de Ensino Superior da instituição.
Embora representem 27% da frota nacional de veículos, as motos são responsáveis pelo maior número de acidentes no Brasil e também de vítimas: foram 285.662 sinistros no ano passado. Os homens respondem por 88% das indenizações por morte em acidentes com motocicletas. No caso de acidentes de motos que resultaram em sequelas permanentes, 79% das indenizações também foram para vítimas do sexo masculino.
“A motocicleta, que é a solução de muitos transtornos no trânsito e também o meio de transporte de classes menos favorecidas, está tirando de circulação uma boa parte da população economicamente ativa. Ainda não temos uma consciência para a utilização desse veículo. Faltam educação, fiscalização e respeito”, acrescenta Mario.
São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro lideram as estatísticas de perdas decorrentes dos acidentes de trânsito. O impacto econômico nesses estados foi de R$ 31 bilhões, R$ 19,5 bilhões e R$ 15,5 bilhões, respectivamente. Segundo os registros, em São Paulo morreram 6.103 pessoas em acidentes no ano passado – quase o dobro de toda a Região Norte. O Rio de Janeiro registrou 2.692 mortes no trânsito, caindo uma posição entre os Estados que têm a maior quantidade de mortos no trânsito brasileiro.
Já o Nordeste lidera em número de acidentes com invalidez permanente: 16.328, sendo 4.499 no Ceará e 2.249 na Bahia. O Centro-Oeste sofreu a maior perda em comparação com o Produto Interno Bruto: o impacto da violência no trânsito consumiu 4,86% do PIB regional, seguido das regiões Nordeste (3,8%), Sul e Norte (3,4% cada). A Região Sudeste foi a que apresentou, ao mesmo tempo, a maior perda em valor absoluto (R$ 76,7 bilhões) e o menor impacto no PIB (2,15%). Isso pode ser explicado pelo fato de o Sudeste ser a região mais populosa do País. No Centro-Oeste, Goiás registrou 1.784 mortes em acidentes e 2.595 casos de invalidez permanente, o que representou impacto de R$ 9,3 bilhões (5,4% do PIB). Mas há casos em que a situação é muito mais grave. Em Tocantins, a perda chega a 7,1% do PIB estadual, recorde no País.
Os números são chocantes, tanto em termos quantitativos como qualitativos. “Não se pode entender como normal haver dezenas de milhares de mortes todo ano, por conta de acidentes no trânsito. Esta tragédia tem várias causas, desde a conservação das estradas à manutenção dos veículos, mas é o comportamento dos condutores a componente de maior impacto”, avalia o diretor.
Ainda segundo o executivo, a não obediência a normas básicas de trânsito, a agressividade ao dirigir e a cultura da esperteza elevam o patamar desta verdadeira epidemia, o que pode espelhar um padrão de sociabilidade, no caso, dos brasileiros. “Além do aspecto educacional, a mudança de cultura também passa por punições adequadas aos infratores”, defende.
Problema mundial. Em todo o mundo, o trânsito mata cerca de 1,25 milhão de pessoas a cada ano e deixa entre 20 e 25 milhões de feridos. Trata-se da nona causa de mortes. Para enfrentar o problema, as Nações Unidas lançaram, em 2011, a Década de Ação pela Segurança no Trânsito 2011-2020, na qual governos de todo o mundo se comprometem a tomar novas medidas para prevenir os acidentes no trânsito. A meta é reduzir pela metade o número de vítimas até o fim da década.
Para atender a essa resolução, o Brasil criou o Plano Nacional de Redução de Acidentes e Segurança Viária para a década 2011-2020. O Plano é composto de ações de fiscalização, educação, saúde, infraestrutura viária e segurança veicular, que visam contribuir para a redução das taxas de mortalidade e lesões por acidentes de trânsito.